Quem tem coragem?

Quando comecei minha empresa tinha muitos sonhos na cabeça, muitos projetos de ação no mercado, uma visão humanista das relações capital/trabalho, enfim, eu acreditava em papai noel.
O mercado é canibal, algumas relações com clientes são como briga de gato e rato (é evidente que eu não sou o gato desta briga), pra resumir, uma luta desigual, mas que faz parte do jogo e que de certa forma eu já previa. O que eu não poderia prever, talvez por ingenuidade ou idealismo, sei lá, eram as decepções que eu teria com o ser humano, este que a gente costuma classificar como racional, afetivo, "humano". 
Muito se fala da urgencia de uma reforma trabalhista no Brasil, porque o custo da mão de obra é muito alto (carga tributária), porque as instituições são travadas, porque o judiciário não funciona (o que particularmente no caso do judiciário, eu não concordo), mas a grande pergunta é: quem vai segurar a caneta na hora de assinar uma reforma trabalhista no Brasil?
Quem votar a favor de uma reforma séria nunca mais será eleito, nem pra síndico no condomínio em que mora. Vão dizer que ele (a) foi responsável pelas perdas dos direitos dos trabalhadores, que politico é tudo igual, que a classe trabalhadora mais uma vez pagou a conta, etc., etc....
A mão de obra no Brasil deixa muito a desejar e parece que quanto pior, mais reivindica "direitos". Por outro lado a classe empresarial, também não consegue dar resposta à altura no que tange aos salários, porque a coisa tá tão pesada, que não há como dar aumento real de salário e eu duvido que a maioria dos empresários não deseja pagar melhor, dar melhores condições de trabalho, tanto de ferramentas para a execução do mesmo, quanto ao ambiente de convivencia dentro das empresas, mas isto é missão quase impossível para os pequenos e médos empreendedores.
No meu caso por exemplo, tenho que formar a mão de obra, por força de legislação. Quando o cidadão já está formado, ele sabe que repor seu posto de trabalho é uma tarefa árdua e demorada, daí começa a briga. Trabalha como quer, falta ao serviço, faz corpo mole, não tem o menor comprometimento com a empresa, nem com seus colegas, nem mesmo com sua família, até o ponto em que voce já não aguenta mais, já preparou sua reposição e o demite. Daí começa uma nova fase. Se tiver mais de um ano de casa, tem que fazer a homologação no sindicato, ou no Ministério do Trabalho, a esta altura voce já pagou as verbas rescisórias, já recolheu a multa sobre o Fundo de Garantia, que aliás voce paga 50% sobre o Fundo depositado e o trabalhador só recebe 40%, os outros 10% ficam para o governo, a título de alguma coisa. Se o cidadão concordar com todos os cálculos da rescisão e assinar a homologação (o que em geral acontece), não significa que seus problemas acabaram. A homologação em tese, serve para dar quitação naquela relação trabalhista (salvo se eu estiver muito errado), mas na prática não é o que acontece, pois durante 24 meses voce fica esperando que chegue alguma notificação de ação trabalhista. Voce já pagou tudo, já deu dinheiro pra todo mundo, às vezes teve que tirar até de onde não tinha pra não ficar devendo nada a ninguém, mas o ser humano muitas vezes é insaciável e sempre tenta se dar bem mais um pouquinho. Uma vez em uma audiencia, um reclamante chegou a me dizer que tinha entrado com ação só pra ver se tinha mais alguma coisa pra receber, porque ele ia casar e estava precisando terminar a casa dele. Disse mais, não é nada contra a empresa, mas o senhor entende, né...
Eu precisei me segurar pra não partir pra cima dele, senão eu ainda poderia ser processado. Senti nojo dele.
Quando eu disse anteriormente que isentava o judiciário das críticas sobre seu funcionamento, o fiz porque a experiencia que tenho tido nas audiencias, é de que a Justiça do Trabalho tem feito a diferença de uns anos para cá. Os Magistrados estão na sua grande maioria fazendo o que os políticos não tem coragem para fazer. Eles estão na prática tornando este embate menos desigual, especialmente a nova geração de juizes. A Justiça do Trabalho está mais sensível à questão social e o que tenho sentido é uma grande disposição dos juizes a um bom acordo para as duas partes. Já participei de audiencia, que o juiz percebeu claramente a má intenção do reclamante e foi conduzindo a sessão com uma calma que me impressionou, até o ponto de dissuadi-lo da maioria das reivindicações absurdas propostas na inicial, discutindo apenas o que realmente poderia ser causa de controvérsia.
Isto posto, resta ainda uma esperança e é o que ainda me faz continuar na luta, mas enquanto não sair uma reforma trabalhista séria, continuaremos nos mantendo em pé sabe Deus como. Só resta a pergunta inicial: "Quem tem coragem para segurar a caneta na hora de assinar?"
Abs

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